Naquela
tarde rodopiei sete vezes à procura da razão, mas só encontrei fantasia. Eu agora
me chamaria Caim e não mais Abel. Seria de outra nacionalidade, falaria o
idioma de minha avó alemã. Cortaria o cabelo curto; rasparia os pelos do corpo
(inclusive aqueles da região libidinal); usaria blache para delinear o rosto;
entre outras coisas que imaginei sentado a beira da lagoa dos patos.
Eu
seria um grande estilista, e não, um pequeno filósofo. Não falaria mais sobre
política e sim sobre bundas. Sim, a bunda como um fenômeno cultural amplo, se
me compreendem! O que seria das mulheres se não fossem essas benditas bundas?
Levaria
Thor (o pitbull skinhead) para defecar na areia da praia, não sentiria remorso,
e sim, uma espécie de satisfação, pois pela primeira vez quem estaria no
comando de tudo seria o ‘id’.
Eu
poderia rir da pobreza, da miséria e aplaudir os corruptos e os desviantes. Que
peso tiraria da consciência! Aliás, pra quê consciência? Ela não seria mais
necessária. Reformularia então a teoria psicanalítica de Freud, ajustando-a ao
meu bel prazer, transformando-lhe numa corrente puramente subjetiva e
simplificada. Note como seria bom não ter ‘superego’! Eu poderia mergulhar sem
roupas na lagoa e quando o guarda tentasse me punir dando voz de prisão por
atentado violento ao pudor, eu diria: “Não tenho ‘superego’ senhor, não podeis
me prender!”.
Um
corpo engessado durante anos pode esconder no comportamento sádico o personagem
carrasco do seu destino, que nesse caso, será o algoz de si mesmo.
Compraria
uma caminhonete a diesel; instalaria um ar condicionado em cada peça do meu
apartamento; teria uma empregada para cada dia da semana; conquistaria toda e
qualquer mulher que passasse a minha frente; agiria sem pensar; casaria num dia
e no outro pediria o divórcio.
Assistiria
telenovelas e memorizaria o nome de cada personagem; beberia e comeria até
passar mal, colocando no lixo as sobras (mesmo sabendo que muitos sentem fome);
cometeria todo dia um pecado e blasfemaria ao vigário da igreja; ainda em relação
à fé, faltaria em todas as missas de domingo.
Apostaria
em corridas de cavalos; fumaria dez maços de cigarro por semana; usaria somente
roupas de grife; locomover-me-ia apenas com carros importados; maltrataria
plantas e animais; pois tudo tende a ser liberado quando damos vazão aos
conteúdos reprimidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário